terça-feira, 19 de maio de 2015

SOBRE O ENSINO RELIGIOSO E ESTADO LAICO – DÉBORA DINIZ

SOBRE O ENSINO RELIGIOSO E ESTADO LAICO – DÉBORA DINIZ





O Artigo 19 da ConstituiçãoFederal de 1988 em seu parágrafo 1º veda qualquer relação ou ligação do Estado com alguma religião ou credo, com ressalva para colaborações de interesse público. A Lei de Bases e Diretrizes da Educação (LDB) de 1996 em seu Artigo 33 estabelece o ensino religioso como matrícula facultativa e integrante da formação básica do cidadão, respeitando a diversidade religiosa e cultural do Brasil e vedando quaisquer formas de proselitismo. Porém, será que estas leis são cumpridas por todo o brasil?
            Grupos como o DERE, Departamento de Ensino Religioso nas Escolas (departamento integrante da OMEBE - Ordem dos Ministros Evangélicos no Brasil e no Exterior) lutam pelo estabelecimento do ensino religioso confessional nas escolas públicas. Ora, não estariam estes em desacordo com as leis brasileiras ou estariam apenas exercendo o direito garantido pelo estado à liberdade religiosa?  
            Para discursar sobre este assunto, a equipe do Debate Sobre o Estado Laico Nas Escolas conversou com a Drª. Débora Diniz, antropóloga e professora da Universidade de Brasília (UnB). Um estudo publicado pela UnB em 2010 e liderado por Débora sobre o Ensino Religioso no Brasil afirma que os livros didáticos mais aceitos nas escolas públicas pregam o cristianismo e estimula a homofobia,  promovendo a intolerância e o preconceito. Segue a entrevista que fizemos com a professora Diniz:


Debate: Você acha que o Ensino Religioso deva ser aplicado nas escolas públicas? Se sim, de que forma? Como o ateísmo seria tratado nesta matéria?
Débora: O Brasil é um país laico. Nesse sentido, o ensino religioso não deveria fazer parte do currículo de nossas escolas públicas. Entretanto, o ensino religioso está previsto na LDB. Já que temos uma legislação que obriga seu ensino, minha aposta é em um ensino religioso secular. Podemos pensar em um ensino religioso que promova a diversidade religiosa, o igual direito de representação de religiões nos espaços públicos, a história das religiões sob uma perspectiva humanista, sem dar preferência para uma corrente ou outra, como acontece hoje com o cristianismo. Vale lembrar que ateísmo não é religião, mas a falta dela. Ser ateu é não acreditar que exista um deus ou deuses. O ensino religioso secular pode ser um bom caminho para a construção do conhecimento entre crianças e adolescentes, independentemente de professarem ou não qualquer religião.



Debate: Nos últimos anos, frentes políticas ligadas à religião se fortaleceram de forma demasiada. Estamos diante do Congresso mais conservador desde 1964. Você considera essa associação entre política e religião perigosa? Ela pode ser prejudicial a laicidade do Estado (incluindo aqui o ensino religioso confessional)?
Débora: Essas frentes políticas conservadoras têm tomado de assalto os meios de comunicação e também o Congresso Nacional. As igrejas têm um papel importante na vida privada das pessoas. Não se deve confundir o lugar das religiões na vida pública e política. Somos livres para eleger crer ou não crer, mas não podemos permitir que crenças específicas colonizem as leis ou direitos. Um Congresso com uma bancada religiosa fere os princípios da laicidade do Estado e pode, sim, prejudicar a dinâmica da democracia no país.

Debate: Sobre o PL 1780/2011, você concorda com obrigatoriedade do ensino da cultura árabe e islâmica nas escolas?
 Débora: A obrigatoriedade é o mesmo que imposição. Por que impor algumas religiões ou culturas e outras não? Volto a repetir: um currículo que contemple a diversidade é muito mais democrático.


Debate: O governo precisa informar melhor a população sobre laicidade do Estado (campanhas nas redes sociais ou TV)?

Débora: Esse é um papel importante para a Educação. É por meio da educação e do acesso ao conhecimento que formamos cidadãos e cidadãs melhores. O princípio da laicidade é um princípio constitucional. Temos inúmeras ferramentas para a disseminação de informação. Vivemos em um país onde os meios de comunicação em massa estão tomados pelas religiões. O Estado é quem fornece as concessões de rádios e tevês. Nesse sentido, o Estado é cúmplice de uma violação básica de um princípio constitucional.


 
(foto: Minervino Júnior/Encontro/DA Press)

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